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O QUE DEVERIA IMPORTAR NUM EVENTO DE MANGÁ E ANIMÊ


por: Alexandre Nagado - Blog Sushi-POP

Há pelo menos uma década, eventos de mangá e animê saíram do gueto dos fãs e atraem multidões animadas. Não sou frequentador de eventos e só vou quando convidado a fazer algo, como uma palestra, workshop ou participar de uma mesa-redonda. Mas é inevitável notar um dado interessante, que revela uma distorção na mentalidade do público e de organizadores.

A realidade é que, num evento de mangá e animê, os astros não são pessoas que trabalham com mangá e animê. São cantores de anime songs e cosplayers (pessoas que se fantasiam e interpretam personagens). Poucos profissionais japoneses da área de animação e quadrinhos já vieram ao Brasil (e sempre por instituições como a Fundação Japão, sem fins lucrativos), mas isso é parte falta de interesse de organizadores, que vêem o que realmente atrai multidões e precisam planejar bem o seu investimento. Entre uma palestra com o criador de Naruto e um concurso de cosplayers de Naruto, temo que a primeira opção seria humilhada pelo público em termos de audiência. Acho legal que os eventos se preocupem em oferecer conteúdo ao público, mas lamento que esse conteúdo atraia somente dezenas ou uma centena de pessoas num evento para milhares de fãs.
Animada multidão que lotou o evento SANA 9,
em Fortaleza (CE),
em julho de 2009
Eventos devem ser divertidos e festivos e, por isso, acho legal encerrar cada dia de um evento com um show de anime songs. Se for com cantores originais, perfeito. Também gosto de ver dubladores fazendo suas vozes ao vivo, pois é uma profissão que tem grandes artistas que ficam escondidos, sem aparecer. Mas um evento temático não pode se prender somente ao lado festivo. Apresentar novidades, debater o gênero e conhecer e debater com os profissionais que criam os personagens que movem essa indústria pop deveria ter um destaque ainda maior. O mais perto que já vi chegar foi receber no Brasil atores de seriados tokusatsu, um assunto que certamente está dentro do escopo de um evento de cultura pop japonesa. Entrevistei em 2003, no primeiro Anime Friends, o ator Hiroshi Watari (Boomerman, Sharivan e Spielvan), que brindou o público com saborosas histórias de bastidores. Mas isso foi exceção, não regra. E ainda não vi nenhum autor japonês de mangá ou animê vindo ao Brasil para um grande evento, somente palestras para públicos bem restritos, como as visitas de Megumu Ishiguro (produtor de Pokémon) a convite da Fundação Japão.

Com todo o respeito aos cosplayers - e tenho vários amigos que o são - acho uma inversão de valores que se ache mais importante ver pessoas fantasiadas de personagens do que ver criadores de personagens. É como dar mais importância ao fã do que ao ídolo. Sei que os autores de mangá no Japão são pessoas muito ocupadas, mas já vi matérias sobre convenções na Europa que levam sim desenhistas de mangá de renome. O evento gira em torno da presença deles e da discussão em torno de suas obras. Cosplayers e as bandas de anime songs são a cereja do bolo, não o recheio principal e motivo do evento acontecer.

Já vi grandes nomes brasileiros da área do mangá e HQ circulando anonimamente em eventos, tomando cuidado para não serem empurrados pelo povo que corre pra tirar foto ao lado de cosplayers. E normalmente, palestras e mesas-redondas com autores e pesquisadores brasileiros atraem muito menos gente do que um desfile de cosplay. Não deveria ser assim. Ou não deveria ser só assim, se houvesse uma valorização maior da cultura.
É ótimo que eventos de cultura pop japonesa tenham vencido a barreira dos fãs e atraiam cada vez mais gente. Mas eu gostaria que isso fosse acompanhado de mais conteúdo, e não apenas festa.


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O blog Maximum Cosmo fez em junho uma matéria sobre um evento francês recheado de nomes importantes do mangá. Um dia, espero que os eventos daqui tenham esse nível de valorização cultural.

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